Acórdão: Apelação Cível n. 2005.012607-9, de Criciúma.
Relator: Des. Mazoni Ferreira.
Data da decisão: 14.07.2005.
Publicação: DJSC n. 11.726, edição de 04.08.2005, p. 38.
EMENTA: AÇÃO DE ANULAÇÃO DE CASAMENTO - ERRO ESSENCIAL SOBRE A PESSOA DO OUTRO CÔNJUGE - REQUISITOS DO ART. 1.557 DO CÓDIGO CIVIL NÃO COMPROVADOS - PEDIDO IMPROCEDENTE - RECURSO DESPROVIDO.
Não caracteriza erro essencial, para fins de anulação de casamento, o comportamento pessoal do cônjuge que torna difícil a convivência conjugal. A insuportabilidade da vida em comum situa-se na órbita da separação judicial, sem lugar para anulação de casamento.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2005.012607-9, da comarca de Criciúma (Vara da Família, Infância e Juventude), em que é apelante E. G. da S. e apelado G. S. R.:
ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Civil, por votação unânime, desprover o recurso.
Custas na forma da lei.
Perante o Juízo da Vara da Família, Infância e Juventude da comarca de Criciúma, E. G. da S. promoveu em 19-7-2004 "Ação de Anulação de Casamento" contra G. S. R., aduzindo em síntese que contraiu núpcias com o requerido em 2-4-2004 e que, após o casamento, houve alteração drástica da personalidade do requerido, culminando com o seu abandono do lar conjugal, sem maiores esclarecimentos. Com tal atitude, o requerido escondeu sua verdadeira personalidade, constituindo erro essencial sobre sua pessoa, autorizando a anulação do matrimônio.
Pugnou pela procedência do pedido, com a condenação do requerido no pagamento das custas e honorários advocatícios.
À inicial, foram acostados os documentos de fls. 7 a 9.
Devidamente citado, o requerido não apresentou resposta (fl. 13v.).
Em audiência de instrução e julgamento, ausente o demandado, foi colhido o depoimento de duas testemunhas.
A autora apresentou suas alegações finais.
O Dr. Promotor de Justiça opinou pela improcedência do pedido.
Sentenciando o feito, a MMa. Juíza de Direito julgou improcedente o pedido inicial.
Inconformada, a autora apelou tempestivamente, propugnando pela reforma da sentença, sustentando, em suas razões recursais, que restou sobejamente comprovado nos autos que, após o matrimônio, o apelado mudou completamente o seu comportamento perante a apelante e seus familiares, caracterizando o erro essencial sobre a pessoa do cônjuge que impossibilita a manutenção do vínculo matrimonial e que, se conhecido anteriormente pela recorrente, não se teria casado.
Sem as contra-razões, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça, e, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, manifestou-se o Exmo. Sr. Dr. Paulo Roberto de Carvalho Roberge pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
Trata-se de recurso de apelação interposto por E. G. da S., irresignada com a decisão proferida nos autos da Ação de Anulação de Casamento, promovida contra G. S. R., que julgou improcedente o pedido inicial.
O recurso é conhecido, porque próprio e tempestivo.
Compulsando os autos, constata-se que agiu com acerto a nobre Magistrada sentenciante ao julgar improcedente o pedido, pois não há prova nos autos que possa autorizar a anulação do vínculo matrimonial.
Segundo o disposto no art. 1.556 do Código Civil, é anulável o casamento em que tenha ocorrido, por parte de um dos contraentes, erro essencial quanto à pessoa do outro cônjuge.
Por sua vez, o art. 1.557 considera erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal, que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado (inc. I). Portanto, os requisitos necessários à anulação do casamento são: que o fato ensejador do desejo de anulação seja anterior ao casamento, desconhecido do cônjuge enganado ao tempo de sua celebração e capaz de tornar insustentável a vida em comum.
Segundo o mestre Carvalho Santos:
"A anulação somente será procedente se realmente o autor foi induzido a erro e que ao outro cônjuge faltam requisitos de honra e boa fama indispensáveis para que seja possível a vida em comum" (in Código Civil Brasileiro Interpretado. vol. IV, 11ª ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1987, p. 228).
In casu, a autora sustenta o seu pedido sob o argumento de erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge ao relatar que o requerido, após o casamento, passou a comportar-se de modo indiferente, e as brigas passaram a ser uma rotina na vida diária do casal, sem, contudo, trazer aos autos nenhuma prova de suas alegações.
Ora, consoante o disposto no artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil, incumbe o ônus da prova à autora, quando se referir a fato constitutivo do seu direito. Portanto, cabe à apelante provar a insuportabilidade da vida em comum em decorrência do comportamento do varão após o matrimônio.
Neste sentido NELSON NERY JÚNIOR leciona:
"Segundo a regra estatuída por Paulo, compilada por Justiniano, a prova incumbe a quem afirma e não a quem nega a existência de um fato (Dig. XXII, 3, 2). O autor precisa demonstrar em juízo a existência do ato ou fato por ele descrito na inicial como ensejador de seu direito." (in Código de Processo Civil Comentado, 3ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1997, p. 615, item I:7).
No caso sub judice, verifica-se que a apelante não comprovou, como lhe competia, a conduta do apelado que venha a caracterizar o alegado erro essencial a ensejar a anulação do casamento.
Destaca-se que o simples fato de o requerido ter alterado o seu comportamento perante a autora e seus familiares não pode, de forma alguma, caracterizar erro essencial de pessoa; serve, sim, para demonstrar a fraqueza do caráter do requerido, a sua instabilidade emocional e insegurança para assumir uma vida a dois, o que certamente tornou insuportável a vida em comum do casal, justificando a dissolução da sociedade conjugal, e jamais a anulação do casamento, como pretende a recorrente.
Compulsando os autos constata-se que não há nenhuma prova concreta de que o réu, ainda que ignorado pela autora, era uma pessoa fria e indiferente, consoante alegado, antes do casamento.
Pelo contrário, os elementos trazidos aos autos demonstram que a mudança de comportamento ocorreu somente após o matrimônio e, sendo assim, somente autorizaria a separação judicial, e nunca a anulação do casamento por erro essencial prevista no art. 1.556 do Código Civil.
Ademais, como bem ressaltou o nobre representante do Parquet, "não se pode admitir que a mudança de comportamento de um rapaz de 17 anos, após o casamento, com quem teve um namoro de apenas seis meses com a autora, possa ensejar a anulação deste por erro essencial, pois não se trata de fato que diga respeito à sua identidade, honra e boa fama, qualidades que têm o condão de viabilizar a ação anulatória, expressamente prevista no artigo 1.557 do Código Civil" (fl. 31).
O erro essencial não está caracterizado, para fins de anulação de casamento, e o comportamento pessoal do cônjuge varão, posteriormente ao casamento, como foi noticiado, tornando insuportável a vida em comum, situa-se na órbita da separação judicial, não ensejando a anulação do casamento.
Em abono à assertiva, colacionam-se os seguintes julgados desta Corte estadual de Justiça:
"FAMÍLIA. ANULAÇÃO DE CASAMENTO. ERRO ESSENCIAL. NÃO-CARACTERIZAÇÃO.
'Não se pode admitir que a mudança de humor do cônjuge varão após o casamento possa ensejar a anulação deste por erro essencial, pois não se trata de fato que diga respeito à sua identidade, honra e boa fama.
'A característica negativa apresentada por um dos cônjuges deve ser preexistente ao casamento, ainda que desconhecida do outro cônjuge.
'REMESSA PROVIDA." (Apelação Cível n. 99.004662-1, de Tubarão, rel. Des. Silveira Lenzi, Terceira Câmara Civil, j. 7-12-99).
"ANULAÇÃO DE CASAMENTO - ERRO ESSENCIAL DE PESSOA - AUSÊNCIA DE PROVA - SENTENÇA CONFIRMADA - APELO - DESPROVIMENTO.
"Indemonstrado o gênio irascível, autoritário, desvinculado das obrigações do lar conjugal, o matrimônio deve persistir. A insuportabilidade da vida em comum exige prova segura a ser considerada em face das circunstâncias em que vivia o casal." (Apelação Cível n. 42.869, da Capital, rel. Des. Francisco de Oliveira Filho, Primeira Câmara Civil, j. 3-5-95).
No mesmo sentido: AC n. 98.000114-5, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Anselmo Cerello, Segunda Câmara Civil, j. 19-3-98; AC n. 96.012136-6, de São José, rel. Des. Nelson Schaefer Martins, Segunda Câmara Civil, j. 15-5-97; AC n. 96.009353-2, da Capital, rel. Des. Cláudio Barreto Dutra, Terceira Câmara Civil, j. 29-4-97.
Destarte, estando ausentes os requisitos que autorizam a anulação do casamento, outra não poderia ser a solução da quaestio senão a improcedência do pedido anulatório.
Isso posto, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se incólume a judiciosa decisão monocrática exarada nos autos.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Monteiro Rocha e Jorge Schaefer Martins, lavrando parecer, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Paulo Roberto de Carvalho Roberge.
Florianópolis, 14 de julho de 2005.
Mazoni Ferreira
PRESIDENTE e RELATOR
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